domingo, 26 de julho de 2009

Adorno e as raízes de um novo holocausto

Penso que a violência já é algo banalizado. Todos sabem que acontece, de que forma acontece e principalmente quem a sofre.

Alunos violentos geralmente têm pais violentos.

A escola lida com diferentes meios de violência: violência que vem da rua, de casa, de filmes, dentro da própria sala, entre os pares...

Penso que a sociedade hoje apresenta essa violência em tão alto grau devido à falta de relações interpessoais. Vivemos entre grades como se fôssemos animais e, animais que vivem em jaulas são animais de certa maneira perigosos.

Não sabemos o nome de nossos vizinhos de porta, não o conhecemos. Já não mais exercitamos as “palavras mágicas”: Bom dia! Como vai? Como tem passado? E o (a) fulano (a) vai bem? Não nos importamos mais com o outro.

A criança que cresce num meio onde as relações entre as pessoas, a cortesia, a boa educação, o cuidado com o outro não foi cultivado e, portanto não terá como conhecer e aplicar este cuidado.

Estamos criando nossas crianças na frente de televisão, dos computadores. Não os deixamos mais brincar na rua (e é perigoso mesmo!), com o colega, com o amiguinho de porta...

Colocamos nossas crianças em frente da televisão, pensando que estão livres da violência deixando-os verem outras crianças ser exploradas e maltratadas (caso da menina Maisa), e isto de forma bem natural e corriqueira como se fosse algo certo de fazer. Acostumamos nossas crianças à violência, pois também fomos educados desta forma massificada pela televisão.


“Crê-se que quanto mais bem forem tratadas as crianças, quanto menos forem negadas na infância, mais chances elas terão. Mas aqui também ameaçam ilusões. Crianças que nem desconfiam da crueldade e da dureza da vida são articuladamente expostas à barbárie uma vez que deixam a sua proteção. Antes de tudo, é impossível incentivar os pais para o calor humano, na medida em que eles mesmos são produto dessa sociedade e dela carregam os estigmas.”


Nossas crianças estão passando, por causa dos nossos medos, por uma overdose de mundo virtual, pensamos que em casa, na proteção do lar, estarão resguardados da violência do mundo. Estamos enganados, pois o que estamos deixando para nossas crianças é a mensagem que na vida também podem dar o comando “Ctrl z”.

Não ensinamos mais nossas crianças a viver a vida de forma autêntica.

Estamos num redemoinho de violência. Estamos perdidos no meio do caos. Não demonstramos mais amor, não olhamos mais o outro. Temos medo de relações verdadeiras.

Silenciamos! Não ensinamos nossas crianças a criar vínculos. E esse silêncio pode ser a semente de uma nova Auschwitz.

O que podemos fazer enquanto escola? É papel da escola fazer esta “ligação” ao outro. É dever de a família conhecer e participar da vida escolar do filho, conhecer as regras da escola e os direitos e deveres de seu filho dentro dela.

União talvez seja o caminho para solucionar o problema.

O ÍNDIO

Há mais pó menos cinco anos fui com uma turma de alunos visitar uma reserva indígena em Viamão.

Lembro que na época fiquei chocada com a pobreza em que eles viviam. Pensava “por que os ambientalistas insistiam em preservar uma cultura indígena?” Por que se insistia tanto que os índios deveriam preservar sua cultura? Por que não os deixavam progredir como pessoas ativas dentro da sociedade? Qual o valor que tinha naquela forma pobre de viver?

Enquanto caminhava pela reserva, pensava na pobreza que via. Na sujeira que eu, pessoa branca, via.

Meu olhar era de extremo preconceito. Via a cultura deles a partir da minha cultura. O meu olhar era um olhar de superioridade, quase ariano. Um olhar de extermínio.

Preconceito puro de quem não conhece ou pensa conhecer.

Andando por lá, voltou a minha memória o caso do índio Galdino queimado vivo em Brasília. Como nós nos achamos superiores! Donos do mundo, donos da terra!

Lembrei das notícias dos jornais, lembrei da fala do advogado de defesa que tentava convencer, nas entrelinhas, a opinião pública que não havia sido cometido crime nenhum. Que os “meninos” não eram capazes de ferir um ser humano.

E o que eu via naquela reserva eram seres humanos sim. Era gente. Gente que já estava aqui quando Cabral chegou.

Gente que viva a vida de modo diferente do meu. Gente em que o sentido de preservação e cuidado com a terra, com a água, com a natureza como um todo era muito superior ao meu.

Voltando para casa e trabalhando com os alunos comecei a me dar conta de todo o mal que fazemos por não conhecer, por não nos interessar pelo outro.

Hoje quando trabalho a cultura indígena já não é de modo ingênuo e caricato. Coloco para meus alunos todo o problema que o índio enfrenta por falta de comprometimento e respeito nosso com eles. Realizamos debates e sempre tento fazer com que meus alunos se coloquem no lugar do índio.

História de Peter

O documentário inicia com Peter chegando à escola. No início do filme, já de maneira extremamente preconceituosa, me coloquei no lugar da “coitada” da professora.
Parei o filme e analisei tudo o que eu estava pensando e posicionei meu pensamento como se fosse eu a professora em questão. Pensei em minha turma (barulhentos, mas ao mesmo tempo tão unidos), minha sala de aula, nas escadas, na falta de ajuda, na falta de trocas de experiências, nas reuniões corridas pela falta de tempo, na falta de pessoas capacitadas para ajudar. Arrepiei-me. Conclui: Não quero esta situação para mim!
Troquei de posição e me coloquei no lugar de mãe, mãe de Peter. E analisei tudo o que eu faria para a melhoria da qualidade de vida, seja mental, intelectual ou física de minha filha. Indignei-me só em pensar que minha filha não tivesse seus direitos respeitados. Conclui: Mãe é mãe sempre.
Coloquei-me no lugar de meus alunos e pensei em todos os problemas que de início apareceriam enquanto a novidade fosse novidade. Continuei a pensar em meus alunos, no quanto eles são puros de coração e receptivos a toda e qualquer situação, sem preconceitos, sem medo de novidade, abertos à aventura da vida. Pensei no quanto gostam de ajudar e a participar de todas as atividades. Teríamos problemas? Certamente. Por causa de Peter? Sim, mas também teríamos inúmeros problemas por várias situações, o que é comum em uma sala de aula que comporta seres tão diferentes e ao mesmo tempo tão iguais. Conclui: problema, só enquanto fosse novidade. Com o tempo Peter seria visto como um colega a mais. A turma com certeza o acolheria, sem maiores problemas ou traumas.
Dificuldade, medo, preconceito para lidar com situações novas e/ou diferentes não fazem parte do universo infantil. O adulto sim está fechado para o diferente, sente medo em não saber lidar com situações que possam fugir de seu domínio e tem medo de se arriscar, de aprender a lidar com situações novas.
Fecha-se por acomodação e descrédito, em especial em relação a escolaridade, pois a literatura especializada também afirma e confirma crenças socialmente difundidas que deficientes mentais somente serão capazes de um aprendizado escolar mínimo, pois são mentalmente incapazes e, portanto, merecedoras de um tratamento especial que impõe restrições que acabarão por imprimir marcas na relação entre o outro e ela.
Com ajuda da literatura que tivermos acesso, lá na formação, na antiga escola normal, nós acabamos por estigmatizar o aluno portador de deficiência.
Somente conhecíamos o igual e, enquanto alunos e sociedade não conheciam as diferenças. Onde estavam essas crianças? Escondidas?
Não foi nos repassado na escola este conhecimento e quando era, era de forma totalmente deturpada.
Nos dias de hoje, nas escolas regulares, vemos um ou outro aluno com deficiência (cadeirantes principalmente), mas não vemos alunos com atraso mental, surdos, cegos...
Por quê? Os pais não matriculam? A escola não aceita? Os pais reconhecem que as escolas regulares não estão capacitadas?
Penso que o pai de aluno portador de algum tipo de deficiência quer o melhor para seu filho e realmente sabem que as escolas regulares não podem oferecer o que seus filhos precisam: aulas de arte, música, espaço para recreação, pessoal capacitado, trocas verdadeiras e envolvimento efetivo de toda a comunidade escolar. Como foi o caso de Peter.
Peter! Consegui me colocar em todos os papéis, menos de Peter. Conseguimos fazer experiências práticas que envolva deficientes físicos, visuais, auditivos... Mas no que envolve deficiência mental, nós falhamos. Não sabemos, não conhecemos. Se não conhecemos não somos capazes de re-significar a educação. Penso que precisamos de crianças especiais dentro de nossas salas de aula para realmente entendermos os conceitos que estudamos e assim aliar à teoria à prática.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Construindo tendas

O grande problema que envolve alunos com necessidades especiais é identificá-los. Existem alunos que se percebe ao olhar que são alunos portadores de alguma necessidade especial: cadeirantes, alunos com alguma síndrome conhecida, surdos e estes não são os que engrossam as estatísticas de reprovação das escolas.
O problema está na falta de conhecimento do professor para detectar estas dificuldades. E muitos casos de alunos PNE’s passam por professores e escolas sem que estes percebam ou que se detectam suas necessidades: falta de uma avaliação oftalmológica, de um exame áudio-métrico, avaliação neurológica...
O professor não foi preparado, nem de forma prática nem de forma teórica, para lidar com estas múltiplas diferenças que os alunos possam apresentar e tampouco a escola está preparada para dar suporte a estes professores. Para a escola só interessa os níveis de aprovação que a colocarão nos índices governamentais como uma escola de bons resultados. Afinal a escola pública é carente de recursos enviados pelos governos e estes recursos somente virão se os resultados forem muito bons.
Nos cursos de formação o professor está sendo preparado, na maioria das vezes, para ensinar a ler e a escrever. E quando se depara com aluno, ou alunos, que não conseguem avançar na leitura e na escrita o professor logo o rotula como deficiente. Não investiga, ou por falta de tempo ou por falta de conhecimento teórico.
É culpado o professor por não reconhecer a necessidade de determinado aluno?
Não. O erro não está no professor. Está nos cursos de formação que não preparam profissionais que saibam lidar, exigir e lutar pela verdadeira inclusão.
O que vemos hoje são alunos largados dentro de salas lotadas consideradas de alunos normais e professores que não recebem nenhum tipo de ajuda e também não a exigem, pois não conhecem as leis de inclusão.
O professor deveria saber que para ter alunos PNE’s a escola, como instituição, tem que dar suporte e assumir todas as necessidades deste aluno.
Existem muitas leis que amparam os alunos com necessidades especiais e pouca ou nenhuma fiscalização que façam que estas leis sejam cumpridas. O professor sabe que existem leis para inclusão, mas não sabe que esta mesma Lei está a favor do professor e do aluno e não contra.
O que vemos nas escolas são alunos largados a um sistema deficiente e professores sem nenhum conhecimento, ou na pior das hipóteses (e eis onde acontece a verdadeira exclusão!), vontade de fazer a inclusão verdadeira.
Vou citar um caso verdadeiro que ocorre na minha escola: Temos um aluno cadeirante na quarta- série. O J.
Para receber J. e sua cadeira a escola construiu rampas e transformou um banheiro para receber este aluno. Fez isso, pois foi obrigada por lei. Mas J. não vai ao banheiro, por vergonha, tem vergonha de depender da professora ou de outro colega.
A professora nos fala, na hora do intervalo, que ele nem água bebe para não ter que ir ao banheiro. É comum sentir-se o cheiro de urina em J. e na sala de aula.
A inclusão de J. termina aí, na modificação do espaço físico. Não é proporcionado a J. durante o recreio nenhuma atividade, simplesmente ele fica esperando o término do mesmo para voltar à sala de aula, sem brincar e sem interagir com os colegas.
Se a família custa buscá-lo na saída do turno, J. fica sozinho, em sua cadeira, esperando pacientemente que alguém venha buscá-lo. Isso é inclusão?
Perguntei a professora de J. como os coleguinhas se relacionam e vêem J., como ele se sente e se vê em relação à turma, qual o trabalho que ela faz em relação ao ver e co-operar com J.
Ela não soube responder. Ela simplesmente me respondeu que ele é uma criança muito desanimada e pouco interessada em estudar e vir para a escola. “É um aluno muito problemático.”
Com 9 anos , numa cadeira de rodas e portador de distrofia muscular não deve realmente ser algo muito animador! E com uma professora que não consegue se colocar no lugar do outro deve ser muito difícil para J. gostar da escola.
Perguntei também como J. ficava dentro da sala e ela me disse que ele ficava sentado sempre no mesmo lugar.
Ela não tem a iniciativa de promover a inclusão de J. com os outros colegas trocando-o de lugar, inserindo-o no grande grupo, não programa estratégias e práticas alternativas Sabe que J. sente dificuldades em escrever mas não procura meios de melhorar a aprendizagem de J. Sabe que J. gosta de computadores mas não o leva às aulas de informática devido as escadas, mas também não exige um computador para J. usar na sala de aula ( segundo ela estaria excluindo todos os outros). A professora não esta se dando conta que incluir é desacomodar todos os incluídos no processo, é fazer com que todos caminhem nas teias da vida.
Penso que a professora de J. deveria ser a gestora de sua educação e tentar construir para J. uma “tenda” onde ele se sinta acolhido e trazer para a tenda de J. todos os outros alunos.

Etnias


O trabalho sobre etnias foi o mais gratificante para mim e penso que para meus alunos também.

Os frutos do trabalho ainda são colhidos na sala de aula até os dias de hoje. Minha turma se tornou unida com o reconhecimento das diferenças e se respeitam principalmente a partir disto. Sabem que são diferentes uns dos outros, com gostos diferentes e diferentes modos de pensar e de aprender.

Nota-se a amizade e o companheirismo entre eles. O clima de amizade e reconhecimento é tão grande, que recebemos um coleguinha novo, que antes apresentava problemas de agressividade e agora já se sente parte de um grupo que o respeita por ser que ele é e não por ser mais forte. Já consegue interagir com o grupo sem agressões, já consegue trocar sem se sentir prejudicado ou prejudicar alguém. Já é um aluno que se estudasse na escola do filme seria rotulado de normal.

Trabalhar etnias foi um trabalho libertador tanto para mim quanto para meus alunos, pois já não sentimos mais temor de falar a palavra “negro” dentro da sala de aula. Antes, em outros anos, me parecia que era algo de certa maneira forçado por mais que eu tentasse fazer de maneira natural, sempre me intimidava frente a um aluno negro. Me envergonhava, tinha medo de ofendê-lo!


Entre os muros da Escola

O que chama a atenção no filme é a questão da “exclusão” escolar, pois desde o início das atividades escolares que o filme retrata, notam-se os pré- conceitos com que os professores olham os alunos.
Os alunos já chegam marcados para os professores atuais. E estes já entram na sala com seus conceitos previamente formados.
O professor de francês até tenta fazer e ser diferente, mas falta-lhe um pouco de amor ao outro, a sensibilidade de perceber o momento do aluno.
Parece que nesta escola o “bonzinho”, “o bonitinho”, “o limpinho”, se sentirá mais facilmente adaptável e também aceito pelos professores e será bem falado para as suas famílias durante os conselhos de classe.
Os alunos que compõe a turma são de diferentes etnias e possuem as suas diversidades culturais e apresentam-na de diferentes maneiras, mas parece que a escola não quer ver, pois cada professor também tem seus problemas de vida e problemas dentro das salas de aula com os alunos, não conseguem ou não estão preparados para lidar com o tipo de clientela da escola: alunos oriundos de outras culturas, bem diferentes da francesa e, portanto, já previamente rejeitados pela sociedade.
A convivência vai se tornando muito difícil quando os alunos passam a ser mais autônomos e questionam os métodos dentro da sala de aula.
Entre os muros da escola é um filme que alerta retratando o cotidiano das escolas públicas da periferia de Paris, mas percebe-se em sua temática algo a - espacial.